O legítimo proprietário de um imóvel pode reivindicá-lo mesmo contra um terceiro adquirente de boa-fé, caso o registro na matrícula tenha sido cancelado por estar baseado em uma escritura pública inexistente.
A Terceira Turma do STJ no REsp 2.115.178, assim decidiu ao negar provimento ao recurso de uma empresa que havia comprado um imóvel com base em uma escritura pública falsa. A empresa buscava manter o bem, invocando a proteção ao terceiro adquirente de boa-fé, prevista no artigo 54, parágrafo 1º, da Lei 13.097/2015.
Porém, como destacou a ministra Nancy Andrighi, essa norma não regula as consequências jurídicas do cancelamento do registro anterior, situação tratada no artigo 1.247 do Código Civil (CC), que permanece vigente.
O caso começou quando o espólio do legítimo proprietário entrou com ação para provar que o imóvel nunca foi vendido ao réu, pois a suposta escritura de compra e venda registrada anos depois era falsa. Posteriormente, o imóvel foi vendido a uma empresa que alegou ter adotado todas as cautelas necessárias ao comprá-lo.
As instâncias ordinárias declararam a inexistência da escritura pública, anulando as operações de compra e venda. Aplicando o artigo 1.247, parágrafo único, do CC, o TJSP afirmou que o cancelamento do registro de título aquisitivo permite ao proprietário reivindicar o imóvel, independentemente da boa-fé do terceiro adquirente.
Nancy Andrighi destacou que os registros públicos visam garantir a autenticidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos, mas, caso isso não ocorra, o artigo 1.247 do CC permite a retificação ou anulação do ato.
A ministra explicou que o artigo 54 da Lei 13.097/2015 não trata especificamente das consequências jurídicas do cancelamento do registro anterior, sendo essa questão regulada pelo artigo 1.247 do CC. O objetivo do artigo 54 é concentrar dados na matrícula do imóvel e assegurar a posição de boa-fé do adquirente, não podendo ser-lhe opostos direitos de terceiros não registrados.
Nancy Andrighi concluiu que, embora o caso envolva conflitos de interesses legítimos, o proprietário nunca imaginaria perder sua propriedade por uma escritura fraudulenta.
O CC regulamenta essa situação de forma equilibrada, protegendo primeiro o legítimo proprietário e, depois, o adquirente de boa-fé. Por fim, a ministra salientou que o adquirente de boa-fé pode buscar indenização por perdas e danos contra quem lhe vendeu o imóvel indevidamente.
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