DIREITO DE PREFERÊNCIA E A CLÁUSULA DE VIGÊNCIA NOS CONTRATOS DE LOCAÇÃO

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Debora Cristina de Castro da Rocha[1]

Camila Bertapelli Pinheiro[2]

Resumo

O presente artigo tem o condão de apresentar a importância do direito de preferência, bem como da cláusula de vigência nos contratos de locação, abordando as diferenças e as peculiaridades que cada dispositivo possui, e especialmente, a necessidade de tornar públicos tais direitos, ante a realização dos registros e das averbações dos contratos à margem da matrícula, que culminarão na possibilidade de oposição à terceiros na relação locatícia. Dada a imprescindibilidade da presença dos referidos institutos jurídicos, faz-se necessário fazer uma digressão sobre a importância de inclusão dos dispositivos nos contratos de locação.

Fundamentação

Quando tratamos de alienação de imóvel locado, seja esse comercial ou residencial, se torna necessário proceder à realização de observação aprofundada quanto aos requisitos que se voltam a garantir os direitos na relação contratual em tela.

Pois bem, a lei 8.245/91, vulgarmente conhecida como a Lei do Inquilinato, disciplina as relações locatícias, estando nela dispostas duas formas de proteção do locatário quando falamos em alienação do imóvel locado, a saber: O direito de preferência e a cláusula de vigência.

Inicialmente, trataremos do direito de preferência que está presente no artigo 27 da lei nº 8.245/91[3], cujo qual deve estar albergado em todos os contratos de locação, o que por sua vez, terá o escopo de limitar os direitos do locador quando ele pretender alienar o imóvel, uma vez que estará adstrito ao dever de cientificar o locatário desta venda. A comunicação deve ocorrer por meio de notificação judicial, extrajudicial ou outro meio que dê ciência inequívoca sobre a pretensão, oportunizando assim ao locatário, o exercício do seu direito de preferência.

A notificação ou comunicação, deverão conter, impreterivelmente, todas as condições do negócio e, em especial, o preço, a forma de pagamento, a existência de ônus reais, bem como a informação sobre o local e o horário em que o locatário poderá examinar a documentação relativa à alienação[4], porém, vale destacar que um ponto de suma importância nesse caso, versa sobre a obrigação de que o locatário exerça o seu direito de preferência no prazo de 30 (trinta) dias, sob pena desse direito caducar, consoante disposto no art. 28 da Lei do Inquilinato ao asseverar que “o direito de preferência caducará se não manifestada, de maneira inequívoca, sua aceitação integral à proposta”.[5]

Para que o direito de preferência seja exercido, imperioso que o contrato de locação seja averbado à margem da matrícula do imóvel no competente cartório de Registro de Imóveis. A averbação do contrato de locação garante ao locatário a sua aposição à transmissão da propriedade mediante o exercício do seu direito de preferência, em decorrência do direito real averbado à margem da matrícula do imóvel.

Caso não seja realizada a averbação do contrato na matrícula do imóvel, poderá ocorrer de o locador alienar o imóvel sem respeitar a preferência do locatário na aquisição, restando apenas ao locatário reclamar posteriormente perdas e danos[6].

À vista disso, percebemos o quão importante se revela dar publicidade ao contrato de locação, uma vez que a sua publicização se volta à ideia de tornar cognoscível a qualquer um a existência de qualquer ônus que recaia sobre determinado imóvel, do que se depreende que somente se poderá impor o dever de respeito e observância do contrato, quando esse for levado à conhecimento de todos a partir da sua averbação à margem da matrícula do imóvel.

A denominada publicidade dos atos registrais sempre existiu, porém, houve a alteração na sua forma em razão da complexidade dos negócios jurídicos envolvendo a transmissão de propriedade e da consequente necessidade de adaptação. Nesse sentido, a concepção que se busca evidenciar, se presta a esclarecer que todos os direitos imobiliários, tais como a cláusula estabelecendo a preferência no contrato de locação e outras disposições correlatas, somente originarão direitos em face de terceiros, após a sua averbação à margem da matrícula junto ao cartório de Registro de Imóveis, do que se permite inferir que, não havendo a mencionada averbação, sobrevirão apenas direitos de cunho obrigacional.

Para além disso, certo ainda que a publicidade garante a segurança das relações jurídicas, o que permite fazer com que qualquer interessado possa ter ciência quanto a eventuais implicações jurídicas negativas relativamente ao imóvel que está sendo objeto de negociação, o que torna o direito averbado à margem da matrícula, oponível a todos, não cabendo à terceiros alegarem o seu desconhecimento.

Nessa oportunidade, consoante disposto no art. 33 da Lei 8.245/91, o locatário poderá adquirir o imóvel locado apenas mediante o pagamento do preço pago pelo terceiro, juntamente com as despesas da transferência do imóvel, desde que o contrato tenha sido devidamente averbado pelo menos trinta dias antes da alienação do imóvel.

Muito embora o dispositivo supramencionado esteja em nosso ordenamento jurídico para possibilitar que o locatário tenha suas garantias preservadas, nem sempre se mostra possível o exercício desse direito, considerando que devem estar reunidas as condições por parte do locatário voltadas ao pagamento do preço, algo que nem sempre ocorre, mesmo quando existe a intenção de permanecer no imóvel.

No caso do direito de preferência, vale enfatizar que se está diante da necessidade de averbação do contrato de locação à margem da matrícula e não de registro como desavisadamente se pode vir a imaginar. E nesse aspecto, importante esclarecer que a averbação se diferencia de registro, de acordo com o disposto na Lei 6.015/73 (Lei de Registros Públicos)[7].

Nesse sentido, diferentemente do direito de preferência que deverá ser averbado à margem da matrícula do imóvel, a cláusula de vigência no caso da alienação da coisa locada, deverá ser registrada junto ao cartório de Registro de Imóveis, conforme artigo 167 da lei 6.015/73[8].

Assim, ultrapassada a discussão sobre a importância do direito de preferência, importante igualmente para o nosso estudo, a cláusula de vigência em caso de alienação[9], que tem por escopo garantir que o contrato de locação permaneça vigente mesmo diante de eventual alienação do imóvel, ou seja, obriga o adquirente a manter o contrato de locação após a alienação do imóvel.

Com base na análise trazida no presente artigo, tem-se que os registros se caracterizam “como um sinal exterior, ou meio legal de publicidade, em garantia dos direitos com relação aos seus titulares e à validade de seus efeitos, relativamente a terceiros. Os registros se prestam assim para ficar à disposição do público, com o objetivo de amparar o crédito em geral e prevenir fraudes, além da garantia natural que outorgam aos negócios[10].

Não obstante, se de um lado o direito de preferência e a cláusula de vigência se constituem como garantias do locatário, por outro, não se pode desprezar o fato de que os referidos institutos jurídicos podem se constituir em limitações ao exercício do direito de propriedade do locador, uma vez que, por exemplo, a utilização da cláusula de vigência, a depender da situação, pode vir a obstar a celebração de negócios importantes tendo por objeto o imóvel locado, podendo, até mesmo, vir a caracterizar abuso de direito por parte do locatário em alguns casos.

Assim, diante do que fora invocado no presente artigo, resta claro que a publicização dos atos registrais se revela de máxima importância para assegurar os direitos envolvidos no contrato de locação, em especial dos locatários, haja vista a possibilidade de opor tais direitos à terceiros. Todavia, não restam dúvidas de que não se pode utilizar dos direitos invocados em descompasso com o ânimo que motivou o seu advento, sob pena de se desnaturar tais institutos jurídicos, e até mesmo, de se incorrer em eventual abuso de direito, principalmente quando se pretender utilizar, por exemplo, a cláusula de vigência em contrato de locação que já se tornou por prazo indeterminado, ou quando não foi exercitado o direito de preferência, conforme preceitua o artigo 28 da Lei 8.245/91, dentre tantas outras hipóteses nas quais o pretenso exercício de direitos não se sustentaria.

[1] Possui graduação em Direito pelo Centro Universitário Curitiba (2010), advogada fundadora do escritório DEBORA DE CASTRO DA ROCHA ADVOCACIA, especializado no atendimento às demandas do Direito Imobiliário e Urbanístico, com atuação nos âmbitos consultivo e contencioso; Doutoranda em Direito Empresarial e Cidadania do Centro Universitário Curitiba; Mestre em Direito Empresarial e Cidadania pelo Centro Universitário Curitiba; Pós-graduada em Direito e Processo do Trabalho e em Direito Constitucional pela Academia Brasileira de Direito Constitucional (ABDConst) e Pós-graduanda em Direito Imobiliário pela Escola Paulista de Direito (EPD); Professora da pós-graduação do curso de Direito Imobiliário, Registral e Notarial do UNICURITIBA, Professora da Escola Superior da Advocacia (ESA), Professora da Pós-graduação da Faculdade Bagozzi e de Direito e Processo do Trabalho e de Direito Constitucional em cursos preparatórios para concursos e para a OAB; Pesquisadora do CNPQ pelo UNICURITIBA; Pesquisadora do PRO POLIS do PPGD da UFPR; Presidente da Comissão de Direito Imobiliário da OAB/subseção SJP triênio 2016/2018, Vice presidente da Comissão de Fiscalização, Ética e Prerrogativas da OAB/subseção SJP triênio 2016/2018; Membro da Comissão de Direito Imobiliário e da Construção da OAB/seção Paraná triênio 2013/2015 e 2016/2018; Presidente da Comissão de Direito Imobiliário e Urbanístico da Associação Brasileira de Advogados (ABA) Curitiba; Membro da Comissão de Direito à Cidade da OAB/seção Paraná; Membro da Comissão do Pacto Global da OAB/seção Paraná; Membro da Comissão de Direito Ambiental da OAB/seção Paraná; Membro do Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário – IBRADIM; Segunda Secretária da Associação Brasileira de Mulheres de Carreira Jurídica (ABMCJ); Palestrante, contando com grande experiência e com atuação expressiva nas áreas do Direito Imobiliário, Urbanístico, Civil, Família e do Trabalho, possuindo os livros Reserva Legal: Colisão e Ponderação entre o Direito Adquirido e o Meio Ambiente Ecologicamente Equilibrado e Licenciamento Ambiental Irregularidades e Seus Impactos Socioambientais e vários artigos publicados em periódicos, capítulos em livros e artigos em jornais de grande circulação, colunista dos sites YesMarilia e do SINAP/PR na coluna semanal de Direito Imobiliário e Urbanístico do site e do programa apresentado no canal 5 da NET – CWB TV. [2] Possui graduação em Direito pela Universidade Positivo (2019), advogada no escritório DEBORA DE CASTRO DA ROCHA ADVOCACIA, especializado no atendimento às demandas do Direito Imobiliário e Urbanístico, com atuação nos âmbitos consultivo e contencioso. E-mail: camila.dcr.adv@gmail.com. [3] Art. 27. No caso de venda, promessa de venda, cessão ou promessa de cessão de direitos ou dação em pagamento, o locatário tem preferência para adquirir o imóvel locado, em igualdade de condições com terceiros, devendo o locador dar lhe conhecimento do negócio mediante notificação judicial, extrajudicial ou outro meio de ciência inequívoca. [4] Parágrafo único. A comunicação deverá conter todas as condições do negócio e, em especial, o preço, a forma de pagamento, a existência de ônus reais, bem como o local e horário em que pode ser examinada a documentação pertinente. [5] Art. 28. O direito de preferência do locatário caducará se não manifestada, de maneira inequívoca, sua aceitação integral à proposta, no prazo de trinta dias. [6] Art. 33. O locatário preterido no seu direito de preferência poderá reclamar do alienante as perdas e danos ou, depositando o preço e demais despesas do ato de transferência, haver para si o imóvel locado, se o requerer no prazo de seis meses, a contar do registro do ato no cartório de imóveis, desde que o contrato de locação esteja averbado pelo menos trinta dias antes da alienação junto à matrícula do imóvel. Parágrafo único. A averbação far se á à vista de qualquer das vias do contrato de locação desde que subscrito também por duas testemunhas. [7] Art. 167 – No Registro de Imóveis, além da matrícula, serão feitos. […] II – a averbação: 16) do contrato de locação, para os fins de exercício de direito de preferência. [8] Art. 167 – No Registro de Imóveis, além da matrícula, serão feitos. I – o registro: […] 3) dos contratos de locação de prédios, nos quais tenha sido consignada cláusula de vigência no caso de alienação da coisa locada; [9] Art. 8º Se o imóvel for alienado durante a locação, o adquirente poderá denunciar o contrato, com o prazo de noventa dias para a desocupação, salvo se a locação for por tempo determinado e o contrato contiver cláusula de vigência em caso de alienação e estiver averbado junto à matrícula do imóvel. [10] MELO FILHO, Álvaro. Princípios do direito registral imobiliário. Revista de Direito Imobiliário, [s. L.], v. 17, n. 17/1986, p.25-50, jan. 1986. DTR\1986\235.

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