Em recente decisão no recurso especial nº 2097457 – RJ (2022/0266520-0), relatado pela ministra Nancy Andrighi, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve uma multa de R$ 10 milhões imposta a um réu que descumpriu uma obrigação judicial.
O caso, que se arrasta desde 1983, envolve uma complexa disputa entre vizinhos sobre a altura de um muro que divide seus imóveis. A controvérsia não se limita apenas à estrutura do muro, mas também à necessidade de poda das árvores plantadas pelos vizinhos, que cresceram a ponto de bloquear a circulação de ar, a entrada de luz solar e a vista panorâmica para a Lagoa Rodrigo de Freitas.
A situação gerou um conflito prolongado, com diversas ordens judiciais sendo emitidas ao longo dos anos para resolver a questão. No entanto, o descumprimento contínuo das ordens levou à imposição de multas expressivas, culminando em um valor acumulado de milhões de reais. A controvérsia ilustra a complexidade das relações de vizinhança e a importância de cumprir as determinações judiciais para evitar penalidades severas.
Os recorrentes alegaram que a multa diária, conhecida como astreintes, era exorbitante e que a obrigação de fazer havia sido cumprida em quase sua totalidade. No entanto, a ministra Nancy Andrighi destacou que a multa foi proporcional à obrigação e que o valor elevado resultou da negligência do réu em cumprir a determinação judicial. Ela enfatizou que a multa não poderia ser reduzida, pois a única causa para o valor elevado foi o descaso do devedor.
Além disso, argumentou a Relatora que consoante jurisprudência da Corte Superior, a verificação da existência de exorbitância da multa cominatória por descumprimento de decisão judicial não pode ser direcionada apenas à comparação entre a quantia total da penalidade e o valor da obrigação principal, devendo ser analisado o valor estabelecido diariamente como multa à parte recalcitrante.
A relatora, ministra Nancy Andrighi, destacou que os recorrentes, pela terceira vez, interpuseram recurso dirigido à Corte, com o objetivo de suscitar questões referentes à obrigação de fazer, que deveria ter sido cumprida há quase 40 anos. Segundo a ministra, o cenário apresentado é de vizinhos que abusaram do direito ao plantio de árvores em imóvel de sua propriedade, descumprindo obrigações previamente assumidas nos autos de processos judiciais.
Tal fato, conforme argumentado pela relatora, revela a razoabilidade da multa periódica fixada como medida de apoio ao cumprimento de ordem judicial, que deve ser cumprida por qualquer pessoa em um Estado de Direito. A ministra também ressaltou que, devido à recalcitrância reiterada dos recorrentes em cumprir a ordem judicial, o montante acumulado da multa diária atingiu o valor de R$ 20.099.490,70, sendo posteriormente reduzido pelo Tribunal a quo para R$ 10.000.000,00.
O ministro Moura Ribeiro apresentou um voto divergente, sugerindo a redução da multa para R$ 500.000,00, argumentando que o valor era desproporcional em relação à obrigação original. Ele sugeriu que, se a multa não foi suficiente para fazer o vizinho podar as árvores, deveria ser substituída por outra medida de apoio. No entanto, sua posição foi vencida na votação.
Essa decisão acaba servindo com uma importante reflexão sobre questões que envolvem conflitos entre vizinhos, chamando a atenção, especialmente, sobre a necessária observância dos limites impostos ao direito de propriedade, seja em casos similares ao discutido no processo objeto de análise, seja em tantos outros comumente evidenciados em nosso cotidiano.