A NÃO INCIDÊNCIA DE IMPOSTO DE TRANSMISSÃO DE BENS IMÓVEIS (ITBI) NA CESSÃO DE DIREITO: BENS IMÓVEIS

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Debora Cristina de Castro da Rocha[1]

Camila Bertapelli Pinheiro[2]

Edilson Santos da Rocha[3]

Por unanimidade, o Supremo Tribunal Federal reconheceu a existência de repercussão geral da questão constitucional suscitada sobre a não incidência do ITBI na cessão de direitos de bens imóveis, reafirmando assim, a jurisprudência dominante sobre a matéria, em razão das controvérsias instauradas na cobrança realizada pelas fazendas públicas municipais em total desacordo com o determinado pela legislação.

A Constituição Federal, em seu artigo 156[4], prevê que os Municípios têm competência para instituir o Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis Inter Vivos (ITBI), que deve ser cobrado pelo município em que o bem está localizado. O ITBI tem como fato gerador a transmissão de bens imóveis, inter vivos, a qualquer título, por ato oneroso, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como a cessão de direitos relativos às transmissões anteriormente mencionadas, o que se perfectibiliza na forma prevista no art. 1.227 e 1.245, ambos do Código Civil[5], ou seja, no momento da realização do registro.

O Código Civil é claro ao mencionar que a transmissão de bens imóveis só ocorrerá no momento em que se der a lavratura da escritura pública no Registro de Imóveis, o que corrobora o preconizado pelo Código Tributário Nacional, que ao mesmo tempo, estabelece em seu artigo 113, §1[6], a ocorrência do fato gerador do ITBI que desencadeia a obrigação de pagamento do tributo e a extinção da obrigação.

A controvérsia se instaurava em decorrência da dúvida acerca da possibilidade ou não da incidência de ITBI em cessão de direitos de bens imóveis, em razão de a propriedade não ser transferida naquele momento.

Em vista da cessão de direitos não transferir a propriedade, o entendimento se encontra pacificado no Superior Tribunal de Justiça, tendo doravante sido reafirmado pelo Supremo Tribunal Federal, no sentido de permitir a incidência do ITBI somente no momento da transferência no registro de imóveis.

Para os ministros, o fato gerador do ITBI ocorre com a efetiva transferência da propriedade imobiliária, tal como já vinha sendo decidido nos tribunais estaduais, bem como pelo Superior Tribunal de Justiça.

A discussão consta no Recurso Extraordinário com Agravo – ARE 1294969, analisado no tema 1124 como Repercussão Geral, quando no mesmo julgamento, os ministros também votaram a tese a ser reafirmada. Neste caso, além de reconhecer a repercussão geral da matéria, foi acolhida a proposta do ministro relator de julgar o mérito reafirmando a jurisprudência do Supremo[7].

Assim como o Supremo Tribunal Federal, o Superior Tribunal de Justiça já decidira no mesmo sentido, inclusive, no Recurso Especial 57.641/PE, em que a Ministra Eliana Calmon, entendeu que não incide ITBI em “promessa de compra e venda”, pois, o contrato preliminar não necessariamente levará à celebração do contrato definitivo, que consiste no único instrumento hábil a ensejar a cobrança do referido tributo.

O Ministro Francisco Falcão coaduna com mesmo entendimento, tendo em seu voto no Ag.Rg no RE 798.794/SP, afirmado que “o fato gerador do ITBI só se aperfeiçoa com o registro da transmissão do bem imóvel, incidindo, portanto, o tributo somente após o registro no Cartório de Imóveis, sendo descabida a exigência nos moldes da Lei Municipal nº 5.430/89”.

Mesmo com o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, não raramente se instauravam controvérsias diante do caso concreto, o que demandou a pacificação do posicionamento também pelo Supremo Tribunal Federal, que decidiu no mesmo sentido (ARE 1002666-65.2018.8.26.0053 SP), in verbis:

[…] O entendimento da jurisprudência desta Corte é de que o fato gerador do ITBI somente ocorre com a transferência efetiva da propriedade imobiliária, mediante o registro competente […]

(STF – ARE: 1241480 SP – SÃO PAULO 1002666-65.2018.8.26.0053, Relator: Min. MARCO AURÉLIO, Data de Julgamento: 07/11/2019, Data de Publicação: DJe-250 18/11/2019)

Vale destacar que a dúvida sobre o pagamento do tributo não se restringe ao contrato de promessa de compra e venda, espraiando-se ao contrato de alienação fiduciária, quando há incidência do ITBI em razão da compra e da venda na transferência de imóvel, mas não há incidência do ITBI sobre o direito real de garantia oriundo do pacto acessório de alienação fiduciária, porquanto legalmente excetuado como hipótese de incidência (art. 156, II, CF; art. 35, II, CTN).

Ou seja, o Superior Tribunal de Justiça afirma que em operações triangulares, nas quais se encontra a instituição financeira, o vendedor transfere ao comprador a propriedade plena (com incidência do ITBI), de modo que o comprador, agora devedor fiduciante, entrega ao banco, credor fiduciário, a propriedade fiduciária (operação na qual não há a incidência do tributo, pois se trata de transmissão do direito real de garantia, que se consubstancia em hipótese de exclusão tributária). [8]

Já, quando o assunto se concentra no contrato de compra e venda sem a intermediação financeira, o ITBI incidirá sobre a compra e venda realizada diretamente entre vendedor e comprador e não sobre a constituição da garantia, o que, frise-se, somente pode ocorrer mediante a lavratura da escritura pública no Cartório de Registro de Imóveis, que desencadeia a ocorrência do fato gerador do ITBI, consoante artigos 1.227 e 1245 do CC e 113, §1º do CTN.

Por certo que, se houvesse a adequada interpretação da lei, em especial, dos artigos 1.227 e 1.245 do CC e do art. 113, §1º do CTN, as dúvidas quanto à sua aplicação sequer teriam razão de subsistir, uma vez que todas as hipóteses de incidência, de exceção e do respectivo fato gerador se encontram devidamente contempladas.

Por essa perspectiva, indene de dúvida que, a cobrança na cessão de direitos que vem sendo realizada por muitos municípios não encontra fundamento hábil à demonstração do fato gerador, o que de per se, não caracteriza hipótese de incidência tributária. Ou seja, enquanto não houver a alteração da titularidade do imóvel perante o Cartório de Registro de Imóveis, não há como se conceber a ocorrência do fato gerador a legitimar a incidência do tributo, tampouco a sua cobrança.[9]

Desta feita, por óbvio que o contribuinte não deve se sujeitar ao pagamento do referido tributo mediante a mera cessão de direitos, o que caso não seja observado, permite a insurgência pela via judicial.

Portanto, diante do posicionamento recente do Supremo Tribunal Federal, há de se concluir que, a cessão de direitos possessórios não configura hipótese de incidência do ITBI. Isso porque, o CTN, ao vincular a definição do fato gerador do ITBI ao conceito dado pela lei, delimitou o momento da realização da incidência do referido imposto, que se aperfeiçoa unicamente com o registro no Cartório de Registro de Imóveis e não em razão da cessão de direitos possessórios.

Por fim, considerando os inúmeros questionamentos que desaguam no Poder Judiciário mensalmente, visando discutir a incidência do pagamento do tributo, espera-se que com o assentamento da jurisprudência no Supremo Tribunal Federal, haja uma diminuição gradativa, porém, substancial, de discussões acerca do tema.

[1] Possui graduação em Direito pelo Centro Universitário Curitiba (2010), advogada fundadora do escritório DEBORA DE CASTRO DA ROCHA ADVOCACIA, especializado no atendimento às demandas do Direito Imobiliário e Urbanístico, com atuação nos âmbitos consultivo e contencioso; Doutoranda em Direito Empresarial e Cidadania do Centro Universitário Curitiba; Mestre em Direito Empresarial e Cidadania pelo Centro Universitário Curitiba; Pós-graduada em Direito e Processo do Trabalho e em Direito Constitucional pela Academia Brasileira de Direito Constitucional (ABDConst) e Pós-graduanda em Direito Imobiliário pela Escola Paulista de Direito (EPD); Professora da pós-graduação do curso de Direito Imobiliário, Registral e Notarial do UNICURITIBA, Professora da Escola Superior da Advocacia (ESA), Professora da Pós-graduação da Faculdade Bagozzi e de Direito e Processo do Trabalho e de Direito Constitucional em cursos preparatórios para concursos e para a OAB; Pesquisadora do CNPQ pelo UNICURITIBA; Pesquisadora do PRO POLIS do PPGD da UFPR; Presidente da Comissão de Direito Imobiliário da OAB/subseção SJP triênio 2016/2018, Vice presidente da Comissão de Fiscalização, Ética e Prerrogativas da OAB/subseção SJP triênio 2016/2018; Membro da Comissão de Direito Imobiliário e da Construção da OAB/seção Paraná triênio 2013/2015 e 2016/2018; Presidente da Comissão de Direito Imobiliário e Urbanístico da Associação Brasileira de Advogados (ABA) Curitiba; Membro da Comissão de Direito à Cidade da OAB/seção Paraná; Membro da Comissão do Pacto Global da OAB/seção Paraná; Membro da Comissão de Direito Ambiental da OAB/seção Paraná; Membro do Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário – IBRADIM; Segunda Secretária da Associação Brasileira de Mulheres de Carreira Jurídica (ABMCJ); Palestrante, contando com grande experiência e com atuação expressiva nas áreas do Direito Imobiliário, Urbanístico, Civil, Família e do Trabalho, possuindo os livros Reserva Legal: Colisão e Ponderação entre o Direito Adquirido e o Meio Ambiente Ecologicamente Equilibrado e Licenciamento Ambiental Irregularidades e Seus Impactos Socioambientais e vários artigos publicados em periódicos, capítulos em livros e artigos em jornais de grande circulação, colunista dos sites YesMarilia e do SINAP/PR na coluna semanal de Direito Imobiliário e Urbanístico do site e do programa apresentado no canal 5 da NET – CWB TV. [2] Possui graduação em Direito pela Universidade Positivo (2019), advogada no escritório DEBORA DE CASTRO DA ROCHA ADVOCACIA, especializado no atendimento às demandas do Direito Imobiliário e Urbanístico, com atuação nos âmbitos consultivo e contencioso; Pós-graduanda em Direito Imobiliário na Escola Paulista de Direito (EPD). E-mail: camila.dcr.adv@gmail.com. [3] Assistente Jurídico pelo escritório Debora de Castro da Rocha Advocacia. Acadêmico de Direito pela Faculdades da Industria – FIEP. e-mail: edilson.dcr.adv@gmail.com. [4] Brasil. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm> [5] Brasil. Lei nº 510.406 de 10 de janeiro de 2002. Disponível em < < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm> [6] Brasil. Lei nº 5.172 de 25 de outubro de 1966. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5172compilado.htm > [7] <https://www.jota.info/paywall?redirect_to=//www.jota.info/tributos-e-empresas/tributario/stf-reafirma-jurisprudencia-e-define-que-nao-incide-itbi-sobre-cessao-de-direito> Acesso em 15/02/2021. [8] Superior Tribunal de Justiça. STJ- RECURSO ESPECIAL Nº 1.837.704 – DF (2019/0272711-8). Disponível em: <https://jurisprudencia.s3.amazonaws.com/STJ/attachments/STJ_RESP_1837704_74d65.pdf?AWSAccessKeyId=AKIARMMD5JEAD4VJ344N&Expires=1613548444&Signature=Tly1I0ADKmMre%2BE49qSFmvjU5PI%3D> Acesso em 16 de fevereiro de 2021. [9] BEIJA, Osvaldo Bispo de. ITBI não incide na cessão de direitos de bens imóveis. Disponível em https://www.conjur.com.br/2019-jan-27/osvaldo-beija-itbi-nao-incide-cessao-direitosde-bens-imoveis Acesso em 16/02/2021

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